domingo, 5 de agosto de 2018

A perda do poder de dissuasão e a crise de segurança.

Todos nós, os " cascudos" nunca nos fartávamos de ouvir as historias dos mais antigos,  a respeito do manancial de ocorrências complexas resolvidas pelo Cabo da  Radio Patrulha. Pelo Sgt Supervisor de Baixo Escalão.

Minha  geração, ainda como Capitão,  especializou-se  em  completar infindáveis Serviços de Supervisão, nos quais, em um Golzinho e um Sd ou Cb Motorista , varávamos frias, mornas ou quentes madrugadas,  esquadrinhando todos os centímetros quadrados de nosso espaço territorial. Fosse onde fosse.
Já houve a época que o Cb ou Sgt Cmt do Destacamento mandava recado pra o investigado ou acusado . Este invariavelmente pegava o cavalo, o trem ou o "de a pé "e apresentava-se sem pestanejar.
 Como era bom ouvir as historias do Detetive Le Coq, que da base do Morro determinava que o bandidão descesse pelas próprias pernas e se apresentasse na DP local. E ele ou eles se apresentavam.

Ótimos tempos também aqueles em que o item 01 do Manual de CDC ( Controle de Disturbios Civis ), ou seja Emprego de Técnicas  de Demonstração de Força, a presença ruidosa e as seguidas Vozes de Comando, ao vivo ou com uso de Megafone , eram suficientes para que a Primeira Voz de uma Força de Choque composta de 15 homens,  resolvesse qualquer inicio de Distúrbio em nossa Cidade.

E a gloriosa PATAMO. Resolvia até espinhela caída.

Apenas para completar essa parte inicial,  registro que , quando a VBTP ( Viatura Blindada de Transporte de Pessoal), o destemido  " Caveirão" , foi idealizada e implantada no ano de 2001, seu conceito operacional básico era unica e exclusivamente funcionar como colete a prova de balas coletivo,  que permitisse levar uma fração de tropa morro acima,  em ambiente de confronto bélico deflagrado , proporcionando a vantagem tática sonhada por qualquer  unidade de infantaria , isto é vir de cima para baixo.

Pois bem.
Hoje , no terreno, o que um , dois ou alguns  homens  fardados e armados faziam , e bem, não conseguimos fazer com um Pelotão a 30, uma Cia a 90,  um BPM a 500. ou  um GPAE/ UPP a 1000, até mesmo porque  não mais existem esses  números na coluna do Existente, apenas  na do Previsto.

Uma RP , só se desdobra na maioria dos terrenos de atendimento se estiver reforçada., e muito bem reforçada. Uma Supervisão, seja de Baixo, Medio ou Alto Escalão, principalmente nas longas madrugadas, não mais supervisiona áreas Amarelas, que dirá Vermelhas. É morte certa.

Se o Cb ou Sgt Cmt de destacamentos mandarem recado pra infratores se apresentarem , vão virar alvo de chacota.

Se um descendente do Detetive Le Cocq ousar ir no pé do Morro exigir a apresentação do vagabundo , com certeza morrerá.

A PATAMO hoje, ainda funciona, porém com uma vulnerabilidade atroz.

O já velho e ferido de guerra " Caveirão" , já há alguns  anos é usado para Patrulhamento Ordinário. Milhares de quilômetros  quadrados somente ele entra. E , felizmente , sai.

Então, o que aconteceu ??

É que,  ao longo dos anos, não claro de uma vez só, paulatinamente ,perdemos uma das mais formidáveis ferramentas de trabalho no Policiamento Ostensivo e na Preservação da Ordem Publica, ou seja o Poder de Dissuasão.

Aquela faculdade de impor ao inimigo a nossa vontade, no caso a vontade da lei, sem a necessidade de agirmos fisicamente, sem a necessidade do confronto.
 O bandido sabia que individualmente ou coletivamente, toda a força legal do Estado cairia sobre sua cabeça , caso não respeitasse  as ordens emanadas pelas autoridades,  pelos textos legais.

A  contra resposta era imediata. O Longa Manus legal o alcançaria onde ele estivesse.

Isso acabou. Repito, não foi de uma vez só. Foi através de uma vagarosa curva descendente de autoridade. Vagarosa, porém  de uma eficacia e efetividade impressionantes a favor das hordas criminosas violentas,
Vagarosa, gosmenta , porém  fundamental para a criação e o aumento avassalador da doutrina do domínio territorial da criminalidade violenta em nosso amado Estado do Rio de Janeiro.

Mas nem  tudo está perdido,  temos que recuperar " UU" nossa força e poder de dissuasão sobre a criminalidade.
Não será de uma hora prá outra, e nem depende só das Policias.

Impossível combater em Teatro de Operações de Guerra. regido por uma legislação de Paz.

Impossível combater em Teatro de Operações de Guerra usando PGP ( Plano Geral de Policiamento) e Técnicas de Emprego de Pessoal  planejados para atuação  em tempo de Paz .

Impossível combater em Teatro de Operações de Guerra fazendo parte de um Sistema de Justiça Criminal que acha normal somente um lado morrer.

A Força e o Poder de Dissuasão só voltarão a funcionar como trunfo exclusivo do Estado de forma  eficiente, eficaz e efetivo no combate para o controle da criminalidade violenta em nosso Estado se as leis mudarem e o entendimento de nosso Sistema de Justiça Criminal também mudar.

E isso é perfeitamente possível e nada inédito.